segunda-feira, 17 de junho de 2013

A queda do homem, a queda da nação

Ao fechar desse livro senti todo o peso do que os gregos chamavam de catarse, sob a forma de um sentimento abstrato, de uma elevação melancólica que vinha não sei de onde e me enchia por completo. O poder narrativo de Mann rompe as barreiras do tempo, as barreiras do espaço, tanto na obra, quanto no universo do leitor. Doutor Fausto te leva para regiões de si mesmo inexplicáveis em palavras, onde somente a arte (a arte como deveria ser) é capaz de levar no seu resultado final! Ele te rouba daqui, te coloca num universo paralelo, apesar de todo esforço necessário para ler sua prosa, que é, sem dúvidas, difícil. Isso se deve ao caráter de oralidade da narração, o narrador monologa com o leitor (o que é muito interessante), mas sem abandonar o seu microcosmos, ou seja, ele fala com quem lê falando ao mesmo tempo com si mesmo, o que dá várias vezes um ar filosófico ao livro. Outro ponto "pesado" são os trechos sobre teoria da música, o que é incrível, porque entre as passagens técnicas Mann faz o absurdo de descrever algo tão abstrato quanto a música! Mas o fato de nem todos os leitores (eu por exemplo) não serem músicos, torna meio complexo a leitura.
Quanto a história! Thomas Mann viaja entre dois tempos com seu narrador, Severos Zeitblom,que vive o final da Segunda Guerra Mundial, e volta, através de suas lembranças, até antes do começo da Primeira Guerra, para narrar a vida do amigo protagonista, Adrian Leverkühn, cuja história termina, pasme!, no começo da Segunda Guerra Mundial. A razão é o jogo figurado fodastico de Mann, que faz seu protagonista e seu país dividirem o mesmo destino. Ambos são levados por palavras (Hitler e o diabo) a venderem suas almas em troca do brilho da grandeza, e seu destino é trágico por isso. Quando o Fausto do século XX e o país mais poderoso do mundo partilham do mesmo fim, é natural que a narração abarque ao mesmo tempo ambos. E ao mesmo tempo, a história de Doutor Fausto é a história da arte. A apologia à arte moderna é gritante, romper as barreiras, alcançar o absolutamente novo, transformar em arte o que é apoético! E no fim de tudo, o encontro da beleza com a tristeza, como a dor sem medidas transportada para a arte consegue encarnar o mais elevado tributo, e transformar-se, a tristeza na arte, na expressão máxima de uma época, que, com toda sua perda da "eminência à vida", como diria Lukács, encontra na tragédia a expressão absoluta! Por fim, fica, é claro, o vazio que te acompanha ao terminar uma obra na qual vc mergulhou por muito tempo e que deixará, felizmente, saudade.

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