Era uma vez, há
muitos e muitos anos atrás, uma espécie que a ciência decidiu chamar de “Homo Sapiens” (a denominação vem do
latim e significa “homem sábio”). Essa espécie, assim como nos relata o
fabuloso Wikipédia, tem o cérebro extremamente desenvolvido com inúmeras
capacidades como: raciocínio abstrato, a linguagem, a introspecção e resolução
de problemas.
Mas não é só isso...
Essa espécie (cujo os valores ainda
são questionáveis, mas tudo bem, não é essa a discussão de hoje) sempre possuiu
uma necessidade advinda de uma sensibilidade de se fazer comunicar, interagir
e........... FINGIR.
Para uma tentativa de atingir essa
satisfação o homem sempre recorreu ao Fictus
(Ficção). Melhor esclarecendo, o “Homo Fictus” sempre existiu, o homem
desde os primórdios se revestiu da habilidade de transfigurar a realidade em
ficção, ou como preferem os mais utópicos, fantasia. (Só lembrando, sem um
maior compromisso de esmiuçar o assunto, que a ficção por muitos anos possuiu
também a função da ciência).
Considerando que estamos falando de
uma época absolutamente remota, levamos em consideração a inexistência da
escrita (apesar de não descartarmos a hipótese de as imagens ser uma habilidade
de escrita comunicacional). A forma de compartilhar as histórias ficcionais era
feita, privilegiadamente, através da modalidade oral. Nesse caso, A MÍDIA ERA O PRÓPRIO HOMEM.
Pecaríamos abundantemente se afirmássemos que a prática
oral de contação de histórias não envolve um trabalho estético. Existe toda uma
preocupação que vai desde a postura do contador à entonação de voz. Mas a questão da contação de histórias já
está, ao meu ver, muito bem resolvida e legitimada enquanto uma prática
literária. A questão que pretendo esboçar nessa pequena discussão diz respeito
às novas demandas comunicacionais, mais especificamente, as que apresentam em
sua composição a presença da narrativa ficcional e propor, dessa forma, uma
reflexão sobre uma visível afinidade dessas narrativas emergentes com a
Literatura.
Um primeiro, e mais difícil dos
passos, seria estabelecer um conceito único, concreto, absoluto, autônomo e
(blá, blá, blá) para a Literatura. E
isso, já adiantando, é tarefa impossível, ou no mínimo, falha. Até porque a
literatura é um processo subjetivo que desrespeita paradigmas. Afirmar com toda
autoridade que “Literatura é a arte da palavra” não me convence, pois não se
especifica se essa palavra é impressa, digitalizada, desenhada ou falada.
Alguém teria a coragem de rotular a Literatura como “A arte da palavra
impressa”?
Se assim for feito, vamos dizendo
adeus em garantir que os contos de fadas são literatura, uma vez que se
nasceram da tradição oral...
Eu prefiro, ao invés disso, dizer
que a Literatura é uma narrativa, essencialmente ficcional (construída a partir
da linguagem verbal) capaz de transfigurar a realidade em ficção e provocar no
receptor a maravilhosa “catarse” ao passo em que o permite uma aprendizagem
(seja de uma cultura diferente, épocas distantes, valores pessoais, morais
éticos e tal). Outro fator interessante é que a Literatura tem (não
exclusivamente) a função de um registro de costumes (sociais, linguísticos,
políticos, religioso e blá, blá, blá) pertinentes a uma determinada época.
[Baseando nisso, faça uma reflexão
silenciosa consigo mesmo tomando como objeto as narrativas contemporâneas.... ]
Antes que eu me empolgue demais
nesse assunto e comece a falar exclusivamente dos Best Sellers, me concentrarei no título dessa discussão. A
Literatura do século XXI está sujeita às expectativas do leitor, ok. Mas além
disso, está diretamente ligada a outras demandas artísticas, como por exemplo:
cinema, telenovela, teatro e... Videogames.
É muito comum, atualmente, entrarmos
em uma livraria e encontrarmos um livro com a capa de um filme. É comum também
abrirmos um site de portal e nos depararmos com a notícia de que o nosso livro
predileto será adaptado para as telas. E tornou-se, igualmente comum, vermos um
game exposto nas livrarias em
adaptação impressa. Vivemos em uma cultura em que o game pode ir para o cinema
e depois virar livro, ou então o filme vira game, ou o game vira livro e
vice-versa (quase confuso não é ?! rsrsrs).
Tudo isso faz parte de uma cultura,
a qual o incrível Henry Jenkins chama de “Cultura da Convergência”. Lindíssimo
termo...
Nas palavras de Jenkins (2009):
Por
convergência, refiro-me ao fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas
de mídia, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento
migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer
parte em busca das experiências de entretenimento que desejam. Convergência é
uma palavra que consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas,
culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar
falando. [...] No mundo da convergência das mídias, toda história importante é
contada, toda marca é vendida e todo consumidor é cortejado por múltiplas
plataformas de mídia. (JENKINS, 2009, p. 29)
Essa cultura é fruto de um novo
dilúvio....
Sim, podem pensar no dilúvio
bíblico. Pierre Lévy, dedicou em seu “Cibercultura” um tópico introdutório
denominado “Dilúvios”. Nesse tópico, ele nos remete ao dilúvio ocorrido na
época de Noé e que representou o fim de uma era e o começo de uma nova. O novo
dilúvio, ocorrido há pouco tempo atrás, foi um dilúvio informacional, tecnológico.
Fomos banhados por um imenso oceano de informações, advindas com a internet, e
isso representou o início de uma nova era informacional e tecnológica.
Desse novo dilúvio, surgiram novas
ilhas...
É importante observarmos que esse
novo dilúvio não representou a morte de uma era, mas uma modificação da mesma.
Não é segredo que muitos temeram que os E-books eliminariam as obras impressas,
que o cinema e a televisão fariam as bibliotecas e livrarias serem extintas.
Mas, visivelmente, não é verdade. As livrarias continuam mais cheias do que
nunca. As novas formas de arte estão convergindo e não eliminando as antigas. Bem, concluo que vocês possam se
sentir um pouquinho enganados pelo título desse texto (rsrs). A intenção foi
alertar para o fato de que as novas mídias possuem traços da Literatura. Isso
não quer dizer que deveríamos analisar os Videogames com o instrumental teórico
da Literatura (isso seria colocar um bolo quadrado em uma forma redonda).
Também não estou afirmando com todas as palavras que os Videogames são
Literatura. Mas podemos sim, considerar os games como uma nova forma de
narrativa ficcional.
Cabe, portanto, a Literatura dar
conta de formular um novo instrumental teórico capaz de atender as provocações
da arte.
Espero, no próximo texto, poder
compartilhar informações mais específicas.
Até a próxima...
- Mario Lousada
Mestrando em Teoria da Literatura UEM
Referências
CANCLINI, N.G. Leitores,
espectadores e internautas. Tradução de Ana Goldberger. São Paulo:
Iluminuras, 2008.
COMPAGNON, A. O
demônio da teoria. Literatura e senso comum. Tradução Cleonice Paes Barreto
Mourão e Consuelo Fortes Santiago. Belo Horizonte: UFMG, 2006.
JENKINS,
H. Cultura da convergência. Tradução de Susana Alexandria.
São
Paulo: Aleph, 2009
.
LÉVY,
P. Cibercultura. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo:
Editora 34, 1999.