Divertido,
original, pervertido, e atual! Esses são os adjetivos que melhor descrevem a
obra-prima de Philip Roth, escrita cinco décadas atrás. Com uma combinação de
humor negro e erotismo, Roth cria a textura complexa da vida de um judeu de
meia idade em crise existencial. É impossível não rir e se chocar, e, por mais
assustador que seja, se identificar com algumas situações que apresenta ao
leitor.
Considerado o
maior escritor americano vivo, Philip Roth (que já se aposentou como escritor,
WTF?!) trabalha com a fragmentação do conceito de ser judeu. Seus personagens
enfrentam uma série de conflitos entre a ortodoxia clássica do judaísmo e o mundo
em que estão inseridos. (É importante dizer que mesmo não sendo judeu, esse
conflito acaba falando a quase todas as pessoas do mundo de alguma forma. E,
isso é fundamental!, são escritores americanos como o próprio Roth que mais
influenciaram nossos autores contemporâneos, aqui no Brasil). E é justamente
por esse caminho que O complexo de
Portnoy (Cia das Letras, 2012) leva o leitor.
Quase que um
romance de formação, a trama narra as desventuras do pequeno Alexander Portnoy,
desde sua infância, até muito próximo do tempo presente, onde ele está narrando
(isso mesmo, o próprio Alex é o narrador) para seu terapeuta esses fatos. (Esse
é o diferencial da trama, ela é contada como se fosse o personagem se dirigindo
em uma conversa diretamente à alguém, que, uma vez que o terapeuta só manifesta
sua voz na última frase do livro, é diretamente ao leitor que ele fala).
Philip Roth |
Tendo crescido
entre o peso da marcação de uma mãe controladora e dramática, em oposição ao
vazio de um pai sem atitude e não raramente omisso, Portnoy cresceu como que em
um conflito existencial, onde os papeis de formação de sua personalidade
estiveram trocados entre os pais: o pai era a mãe e a mãe o pai, como ele mesmo
lamenta ao seu psicanalista. Sua mãe (Sophie Portnoy) por vezes, aos olhos do
narrador, é uma psicopata crônica, capaz de ameaçar o filho de cinco anos
durante o jantar com uma faca, pelo simples fato dele se recusar a comer.
Enquanto o pai, um homenzarrão que jamais terá uma vitória pessoal na vida,
chora como uma mocinha virgem ao som da voz irritada do filho. E entre o
sentimento de estar sendo sufocado pela mãe e de frustração pela impotência do
pai, Portnoy encontra desde cedo no sexo (ou na masturbação) a fuga, o escape,
“o meio de manter sua sanidade”.
E deste ponto
começam as perversões do narrador-anti-herói-protagonista. Que nos conta desde
suas experiências bizarras com masturbação (que envolve fígados crus e maçãs
violentadas), até suas extravagâncias com suas namoradas (a que mais aparece no
romance atende pelo apelido carinhoso de Macaca).
Entretanto,
mais que um romance sobre as agruras de um judeu em crise, o romance é uma
leitura (da perspectiva judia, é claro) dos traumas e anseios do homem no
Século XX (e do Século XXI também!). À luz de uma paródia sarcástica e bastante
ácida da psicanálise, Roth refaz o Mal-estar
na civilização num tom divertido e contundente, que vai arrebatar o leitor.
Escrito em plena era da liberação sexual, a atemporalidade do livro é
assustadora, provando que cinco décadas depois, muitos dos “tabus” sociais
continuam em pleno vigor. E é uma obra que, antes de tudo, trata da fragilidade
dos laços humanos, na busca entre realização e plenitude existencial.
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