segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Um certo sujeito José



Já disse aqui no blog que não sou fã de crônicas, mas mesmo assim insisto na leitura do gênero. Não apenas porque eu sou um acadêmico de Letras em um país onde a crônica é um gênero extremamente importante, mas também porque através dela o leitor pode ter um contato diferencial com o autor, conhecendo-o de modo mais próximo, que por seu trabalho ficcional em geral. Foi isso o que me levou a ler o livro O romance morreu (Cia. das Letras, 2004), de um dos meus autores favoritos, Rubem Fonseca. Mas... vamos falar sobre esse livro outra hora, em um espaço que não será uma resenha, porque o livro aborda assuntos muito pertinentes, como a sobrevivência do gênero romanesco e como a arte de fazer pipocas (sim, você realmente leu isso), sendo esses assuntos muito interessantes e merecendo um espaço para se tratar só deles. E entre um diálogo leve com o leitor e outro, Fonseca em vários momentos do livro nos apresenta suas memórias, incluindo de seus tempos em Berlim. Mas (outro “mas”), em sua última crônica do livro, José - uma história em cinco capítulos, ele nos conta sua infância, sua formação como leitor, sua mudança para o Rio de Janeiro, etc., sendo que essa crônica seria adaptada por ele alguns anos mais tarde, acrescentada de mais algumas coisas, e resultaria em uma novela (que está mais para autobiografia), que é a novela José (Nova Fronteira, 2011), sendo até agora seu último trabalho.
Rubem Fonseca 
Vamos lá, a novela José e a última crônica do livro O romance morreu começam da mesma forma, literalmente, é o mesmo texto, que adaptado. Deste ponto em diante (José) Rubem Fonseca vai narrando suas lembranças mais antigas de modo linear – o que com certeza só é possível graças a magia da ficção –, indo desde a casa de seus pais, imigrantes portugueses, onde precisava ler escondido durante a noite, até suas andanças por um Rio de Janeiro que deixou de existir no tempo. A obra é extremamente curta, é possível lê-la de uma sentada, e com tem o mesmo estilo inconfundível que transformou o seu autor em um dos maiores nomes da literatura nacional: um tom direto, objetivo, sucinto em palavras e extremamente fotográfico. A história acompanha somente a vida do autor até próximo aos seus 30 anos, mas é muito interessante na medida em que vai fazendo várias pontes com a obra do autor que estaria por vir.

Desde os porões com animais medonhos e peçonhentos onde costumava brincar na infância, e que são agradáveis ao personagem-narrador no romance Vastas emoções e pensamentos imperfeitos, até seus dramas familiares com os pais e avós portugueses, relatados nos seus primeiros livros de contos. É uma bela aventura pelas memórias (ficcionais) do autor, e um diálogo direto com a pessoa do autor, ao invés da imagem construída do escritor, o que é ótimo, em termos de literatura, para humanizar grandes autores e nos lembrar que a grande literatura nasce do único elemento indispensável para a arte: o gênero humano.

"A maior de todas as criações do ser humano é a cidade. É no centro das cidades que o seu passado pode ser sentido e o futuro, concebido."
– FONSECA, Rubem. José. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011; 47.

Livro da Cia. das Letras O Romance Morreu, com a crônica José - Uma História em Cinco Capítulos:

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